terça-feira, 5 de janeiro de 2010

fotografias em mim

Fotografias, como tantas imagens que quis preservar mas que não consegui. Palavras que estariam antes expressas num pedaço de papel brilhante e que dariam menos trabalho a recuperar... Mas sempre faltou o objecto maravilha que fosse capaz de estar nos sítios certos à hora certa, a maior parte das vezes sem razão, porque nunca se consegue prever quando é necessária a objectiva de uma câmara... Culpa da boa imprevisibilidade da vida, da inconstância saudável que agora faz com que que não existam fotografias, por mais que as queira ter.
Estranho é que me lembro de todos os segundos que queria ter atados num papel para onde pudesse olhar. Lembro-me de todos, de cada um deles melhor que o outro... Mas, não será assim desnecessária a presença de tal objecto? Afinal consigo lembrar-me de tudo o que me quero lembrar, sem que seja fixo, imóvel e ensaiado. Não tenho um sorriso forçado com uma bonita paisagem de fundo num pequeno quadrado, tenho-me antes numa imagem completa a olhar o horizonte naquela praia que tudo diz e sou ainda capaz de ter novamente o cheiro do mar salgado e a textura da areia rija junto à agua. Não tenho um pequeno quadrado com a minha horrível cara de choro, tenho o sabor amargo de cada lágrima custosa de cair, ou feliz, aliás, todas elas... e nunca fui fotografada a chorar. Não tenho um pequeno quadrado com a cara de todas as pessoas que repetidamente me entoaram os parabéns, tenho as suas expressões que muito transmitiram ao longo de uma noite inesquecível...
Parece verdade, parece então que as fotografias são apenas um acessório para quando a memória começa a ficar fraca. Não sei se daqui a alguns anos terei a lucidez para recordar todos os cheiros, todos os lugares, todas as texturas... Aí, talvez gostasse de ter fotografias. Mas não existem, já nem há possibilidade de existirem. Mesmo assim, posso tentar pintar em palavras tudo o que senti e vivi, mas há algo cá dentro que me diz não ser preciso. Afinal sou eu, sou como sou... Como poderia alguma vez esquecer-me daquele abraço que num dia longíquo me causou um arrepio na espinha? Ainda agora me lembro... e é impossível pintar isso. Sou eu, apenas.

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