sábado, 30 de janeiro de 2010

a Corrida.

Há alturas em que estagnamos, em que apenas não conseguimos falar. Um minuto deixa de ter 60 segundos e passa a ter 120 no mesmo espaço de tempo. A vida corre a uma velocidade difícil de acompanhar, mas a corrida é para ser feita até à meta. Existem cruzamentos no percurso onde temos de optar qual a estrada a seguir e nem sempre fazemos a escolha mais fácil. Ainda assim, fazemos uma escolha. Enveredamos por um caminho que nos parece ser o melhor na altura. Só depois, uns metros mais à frente, é que podemos ter a certeza de que fizémos a escolha certa, ou não. Mas continuamos em frente, rumo a um objectivo. Temos momentos de fraqueza, momentos em que o cansaço parece apoderar-se de nós, mas não desistimos. Abrandamos o ritmo, estagnamos até durante algum tempo, mas acabamos por retomar o percurso, é mais forte que nós. Os sapatos começam a ficar gastos e experientes, mas não é por isso que deixam de servir. Os atacadores continuam a prendê-los bem junto aos nossos pés e é somente a sola que vai sofrendo o desgaste e ganhando conhecimento do chão. Todo o resto se mantém inteiro e íntegro, fiel a si mesmo. Continua a corrida, umas vezes connosco a pingar do esforço exigido, outras com sorrisos de uma paisagem bonita e também outras de semblante carregado. Mas há muitas, muitas mais facetas que adoptamos enquanto não alcançamos a meta. Dependendo dos percursos que formos levando, assim se faz a nossa expressão. Uns terminam a corrida muito antes de outros, outros muito depois de outros,... cada um leva o seu tempo. Até eu, que não gosto de correr, participo nesta corrida. Aliás, quem não participa? Mais rápido ou mais devagar, de forma mais ou menos intensa, todos corremos até cruzar a meta. Mesmo quando estagnamos, mesmo quando não conseguimos falar, corremos. É assim, é a vida.

sábado, 23 de janeiro de 2010

estátua de sal

Margarida Rebelo Pinto escreveu:
"Pega no telefone e liga-lhe, não tens nada a perder. Diz-lhe que tens saudades dele, que ninguém te faz tão feliz, que os teus dias são secos, frios e áridos, como um deserto imenso, sem oásis nem miragens, sempre que não estão juntos. Pega no telefone e liga-lhe. Se ele não atender, deixa-lhe uma mensagem. Ou então escreve-lhe um sms a dizer que queres estar com ele. Não te alongues nem elabores, os homens nunca percebem o que queres deixar cair nas entrelinhas. Tens de ser clara, directa, incisiva. E não podes ter medo, porque o medo é o maior inimigo do amor. Cada vez que deixares o medo entrar-te nas tuas veias, ele vai gelar-te o sangue e paralisar-te os nervos, ficas transformada numa estátua de sal e morres por dentro."
Já peguei no telefone, mesmo tendo tudo a perder. Não tenho medo, porque não há nada pior que me faça ter medo. Fui clara, directa e incisiva, sim. Já não uso entrelinhas porque elas não me ajudariam a caminhar melhor sobre esta areia grossa. Os meus dias são secos, frios e áridos, como no deserto, mas tenho oásis, tenho miragens. Não é o medo que me corre nas veias, são essas miragens. São essas miragens que me fazem ser a estátua de sal que se desfaz através dos olhos. São as miragens que um dia poderiam ser verdadeiras mas que, agora, não o são. São os oásis que parecem estar perto, mas que estão tão longe que me fazem ter a certeza de que sim, de que tenho tudo a perder. Tenho tudo a perder, mas não tenho medo. É impossível ter mais medo do que ter tudo a perder. Aliás, já perdi. Já perdi a luta que um dia tentei travar. É por isso que agora não consigo raciocinar mais, não consigo encontrar outra forma de chegar à meta... Mas não era uma meta. Era o pleno, era a capacidade de ter medo por não ter tudo a perder. Não consegui. Que me desculpe a Margarida Rebelo Pinto, mas pareço ter sido fraca de mais. Sim, fui fraca de mais. Resumo-me, portanto, à estátua de sal. Sou uma, que se desfaz lentamente, porque guarda dentro de si muito do que a fez crescer. É, sou uma estátua de sal. Desfaço-me um pouco agora, um pouco mais tarde, um dia por inteiro, algumas horas durante a noite... é, vou-me desfazendo. Sou uma estátua de sal, mas ainda assim continuo a ter coragem de fazer o teu telefone tocar. Mais uma vez.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

chocolate

Dizes não me ter esquecido mas sei que o fizeste já há algum tempo. Mantenho-me quieta e imóvel, porque me custa a assimilá-lo como verdade. Sei que o é, mas não quero sabê-lo. Não quero desabar e ficar mais uma noite perdida em soluços magoados com a verdade que me custa ver.
Lembro-me daqueles dias em que percorrias caminhos para que nos pudéssemos olhar de frente e conversar, rir e falar, apenas. O meu  verdadeiro caminho é o oposto àquele que agora tento seguir, mas pareço estar pregada ao chão sendo-me impossível mudar de direcção. Sei que não vale a pena ir de encontro a ti.
Podia dizer-te mil e uma coisas, mas de nada me valeria. Não sou ninguém para que o mundo mude de mentalidades, muito menos poderia ser alguém capaz de mudar a tua. Por mais que fale, as minhas palavras já não têm som, já não te causam eco. Acabo por passar por tonta quando na verdade sei que é tudo menos uma tonteira. Por mais estranho que pareça, até já estou cansada de tanto falar. Falar quando não nos querem ouvir é o mesmo que dormir noites e noites sem que um sonho nos atravesse o espírito. Falo e não me ouves, tal apenas me revela que estou, como sempre achei, sozinha.
Assim tenho a certeza, assim me conformo sem que o assimile dentro do meu peito. Deixei de existir, sabe-se lá porquê... Não existo mais tal como aquele chocolate perdido em cima da mesa, que alguém comeu e apenas lá deixou o embrulho. Mesmo que em cima da tua mesa já nem o embrulho vazio esteja, na minha permanece o chocolate inteiro, intacto. Será que devia também eu comê-lo e mandar o papel fora? Pode saber-me bem, mas não consigo. Ainda que digas o contrário, sei que já nem te lembras que chocolate eu era.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

estou assustada.

Aperto a caneca do chá para ver se aqueço as mãos. Olho em frente e sorvo um golo da bebida, enquanto a vejo fumegar. Mais um dia que passou e mais um dia que perdi comigo perdida por entre pensamentos inquietos. É, às vezes assusto-me comigo mesma. Lembro-me muitas vezes de o meu pai dizer constantemente que "um dia ainda te vais dar muito mal assim, há pessoas muito estúpidas lá fora e não sabes lidar com elas". Se calhar ele tem razão. Ou então sou apenas eu a pessoa estúpida.
Acho que tenho convicções fortes de mais. Se gosto então gosto mesmo, se falo então falo mesmo, se rio então rio mesmo... e por aí fora. Ainda assim, o falar e o riso chegam sempre à meta, à altura em que param antes de voltar a entrar de novo na corrida. Já o gostar, é muito mais complicado de domar. Aliás, acho que não consigo domá-lo. De tanto gostar, falo e rio que nem uma perdida, mas, essencialmente, escrevo. Quando releio desabafos do meu coração, fico assustada: não consigo imaginar como se sentiria outro alguém ao lê-lo. Há anos que ando nesta busca incessável de encontrar alguém como eu, que consiga compreender o facto de ninguém me compreender a mim, mas não encontro... Continuo, por isso, a sentir de uma forma extrema, porque sentir é o que sei fazer melhor.
Agora tenho medo de que nunca ninguém possa compreender o facto de eu gostar, de eu gostar e não me cansar de o fazer. Porque eu gosto, por cima de tudo, por cima de todos, eu gosto. É até inútil quando alguém diz "vá, não chores", quando simplesmente não consigo não chorar. É estranho quando alguém diz "vá, não te quero assim", mas não consigo não ficar assim. É isto que me assusta, muito. A caneca não consegue aquecer-me as mãos e não consigo explicar o meu coração. Não encontro validade para mais um dia perdido em pensamentos, quando os pensamentos não têm conclusão. Sou assim, louca e devassa do mundo. Ainda que chore, ainda que esteja assim, continuo a gostar. Porquê? Não sei o porquê. Não sei nada a não ser que gosto. Gosto mesmo muito. Talvez o meu pai tenha razão.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

palavras a mais e a menos

Cheguei ao meu ponto de saturação máxima. Já não tenho vontade de rir apenas porque sim. O doce passou a saber amargo. Existem alturas em que nem sempre é tudo fácil e existem também outras em quecomplicamos demais. Ainda assim há momentos em que já não dá para fingir mais e é preciso ver que afinal existem situações em que caímos mesmo e não havia como evitar a queda.
Agora tenho cada vez mais a certeza de que a inocência só está presente nos olhos de uma criança, lá encontro-a a cada dia. Mas existem pessoas a mais com pensamentos desviantes, que acham que esses mesmos pensamentos são inocentes... Nunca fui ninguém para dizer por aí tudo aquilo que me apetece e muito menos para julgar o mundo, mas parece haver quem o faça sem o mínimo problema. O cerne da questão encontra-se no assunto sobre o qual falam: enquanto que falar de nós é complicado, falar dos outros é bem mais fácil do que parece. Aliás, falar dos outros apontando-lhes o dedo, então é ainda mais fácil do que o bem mais fácil de antes. O problema é que as coisas que se dizem, são ditas pela simples vontade de alguém que se acha capaz de o dizer, porque assim o quer.  Esse problema está em quando esse falar manda todos os outros abaixo menos aquele que fala.
Estou, por isso, cansada. Não consigo suportar mais palavras inquietas que apenas servem para me fazer cair agora, hoje e amanhã. Não percebo qual o prazer que existe em dizê-las. Aliás, parece-me que quem as diz nem sabe o efeito que causa ao proferi-las, mas desisto de tentar explicá-lo.
Perdi qualquer ponta de paciência para ser tolerante. A partir de agora vou deixar de perceber palavras ditas a alguém com o simples intuito de magoar o outro. Perdi até a paciência para esperar pelas palavras que alguém deveria dizer, mas não diz. Caí, não quero saber como, nem porquê. Caí e não quero pensar mais no assunto. Caí, desesperei, cansei, e não tenho problema nenhum com isso. Sempre me aguentei, mais um dia, menos um dia... diferença nenhuma faz. A diferença está apenas na certeza de que amanhã, quando acordar, vou achar tudo isto uma enorme parvoíce. Continuarei a deixar-me intimidar por tudo aquilo que é dito e mais ainda por tudo aquilo que ficou por dizer.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

luz sobre mãos

Raios partam que já não posso ouvir aquela guitarra estridente! Por onde anda a harmonia melodiosa? E esta porcaria do toque de mensagem a tocar insistentemente! Preciso de paz, será difícil de perceber?
Eis que olho em volta e percebo que não vale a pena reclamar. Estou sozinha, apenas, com o candeeiro direccionado para as minhas mãos. Sem barulho senão o das teclas a levar com a pressão dos meus dedos, sozinha, perdida em mil pensamentos que me haviam feito sorrir outrora.
Lá toca aquela porcaria outra vez! Credo! E a lengalenga insistente em que nada se percebe! Que se calem, por amor a Deus!
E valerá a pena ser agressiva com o mundo? Valerá a pena deixar de procurar as coisas boas da vida? É que encontrei ao virar da esquina a peça perdida do meu puzzle, mas agora não consigo encaixá-la no sítio certo. Pressiono-a contra o lugar onde deve entrar, mas ela não encaixa. Não se deixa encaixar sabe-se lá porquê...
Oh, por favor, porquê a mim? Porquê este zumbido irritante que vem da máquina de lavar roupa? Deixem-me quieta, por favor!
Não estou perdida, mas perdi um pedaço de mim. Aliás, sei muito bem onde ele está. mas não posso ir buscá-lo. Ele vai voltar, se tiver de voltar. Todo ele é a peça ao virar da esquina que simplesmente não encaixa no puzzle. E não encaixa porque talvez não deve encaixar, apenas não deve encaixar... Mas continuo, continuarei até ter força para tentar com que ela se coloque onde deve estar. Se um dia tiver de desistir, saberei quando chegou a hora certa para o fazer.
Pronto, agora é os pratos! O esquentador a fervilhar! Bolas, desisto! Vou sair porta-fora e vou fingir que faço parte do barulho! Não estou mais calma, não estou mais pensativa, não estou mais nada! Pimbas, la la la e trá-lá-lá!

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Sonhando

Não quero nem saber. Vou dormir, esquecer o mundo e desligar. É o que há a fazer, nada mais. As soluções já foram todas experimentadas e nenhuma resultou. Agora clica-se no botão com convicção e tenta-se a custo que a máquina do pensamento desligue. Apenas não percebo porque é que ela não o quer fazer!
Odeio ainda ter o teu sabor na boca, como recordação inquieta de momentos que já passaram... Não quero lembrar-me de mais nada porque já bastam as saudades que tenho. Afinal o tempo não volta atrás, apenas corre sempre no mesmo sentido.
Não quero nem saber. Apenas continuo, sonhando.


terça-feira, 5 de janeiro de 2010

fotografias em mim

Fotografias, como tantas imagens que quis preservar mas que não consegui. Palavras que estariam antes expressas num pedaço de papel brilhante e que dariam menos trabalho a recuperar... Mas sempre faltou o objecto maravilha que fosse capaz de estar nos sítios certos à hora certa, a maior parte das vezes sem razão, porque nunca se consegue prever quando é necessária a objectiva de uma câmara... Culpa da boa imprevisibilidade da vida, da inconstância saudável que agora faz com que que não existam fotografias, por mais que as queira ter.
Estranho é que me lembro de todos os segundos que queria ter atados num papel para onde pudesse olhar. Lembro-me de todos, de cada um deles melhor que o outro... Mas, não será assim desnecessária a presença de tal objecto? Afinal consigo lembrar-me de tudo o que me quero lembrar, sem que seja fixo, imóvel e ensaiado. Não tenho um sorriso forçado com uma bonita paisagem de fundo num pequeno quadrado, tenho-me antes numa imagem completa a olhar o horizonte naquela praia que tudo diz e sou ainda capaz de ter novamente o cheiro do mar salgado e a textura da areia rija junto à agua. Não tenho um pequeno quadrado com a minha horrível cara de choro, tenho o sabor amargo de cada lágrima custosa de cair, ou feliz, aliás, todas elas... e nunca fui fotografada a chorar. Não tenho um pequeno quadrado com a cara de todas as pessoas que repetidamente me entoaram os parabéns, tenho as suas expressões que muito transmitiram ao longo de uma noite inesquecível...
Parece verdade, parece então que as fotografias são apenas um acessório para quando a memória começa a ficar fraca. Não sei se daqui a alguns anos terei a lucidez para recordar todos os cheiros, todos os lugares, todas as texturas... Aí, talvez gostasse de ter fotografias. Mas não existem, já nem há possibilidade de existirem. Mesmo assim, posso tentar pintar em palavras tudo o que senti e vivi, mas há algo cá dentro que me diz não ser preciso. Afinal sou eu, sou como sou... Como poderia alguma vez esquecer-me daquele abraço que num dia longíquo me causou um arrepio na espinha? Ainda agora me lembro... e é impossível pintar isso. Sou eu, apenas.