domingo, 25 de outubro de 2015

Não

Não. Apaga a luz e vem deitar-te. Aquece-me as mãos e dá-me o teu braço como almofada. Prende-me uma perna com os teus pés e diz-me "boa noite, dorme bem".
Não. Deixa-me estar apenas a ouvir o teu respirar, a focar-me em não me mexer para não te acordar. Vou tapar-te durante todo o tempo para te saber com o melhor sono possível.
Não. Eu quero saber que tenho a cama mais aquecida pelo amor que nos mantém. Eu quero acordar no meio da noite e sorrir quando o meu consciente me lembrar de onde estou. Com quem estou.
Não. Hoje quero que me cantes uma canção de embalar e que me mexas no cabelo até eu adormecer, hipnotizada pelo teu olhar fundo que tão bem me lê.
Não. Hoje não aceito. Hoje não quero e hoje não suporto. Hoje não. Não. Não me deixes ir embora. Não me deixes sair debaixo deste tecto e não me faças entrar por entre lençóis sozinha.
Não. Hoje não posso ficar sem ti enquanto a lua, lá alta, testemunha que aquilo que nos somos e que é verdadeiro como o construímos. Não.
Hoje não fico sem ti.
Não sei como isso é.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

fuga e mistério

Quanta é a saudade que te tenho e não te sei explicar.
Quantos são os pensamentos que te faço e não te sei explicar.
Quantos são os sorrisos que te imagino e não te sei explicar.
Quantos são os medos de que te apanhes numa solidão profunda e não te sei explicar.
Quanta é a vontade de correr para ti e não te sei explicar.
És a fuga e o mistério, a verdade incerta de tão convicta que permanece sempre, a cada dia, naquilo que sou.
Lembro-me de quando isto ainda era normal, se é que alguma vez o foi, em que tanto podia aprender de ti como ensinar-te. Em que as horas não passavam e às tantas o relógio marcava 4h da manhã e o assunto não se esgotava. Em que o abraço forte e gigante a cada despedida tinha cada vez mais calor, cheio de sentires intensos e tão verdadeiros.
Quanta é a falta que fazes, sem que o saibas.
Quanta é a grandeza do que és, sem que o saibas.
Quão importante é ver-te crescer assim, sem que o saibas.
Quão verdadeiro é imaginar o nosso futuro, sem que o saibas.
Quão único é aquilo que nos somos, sem que o saibas.
Nem eu o sei.
Ou então sabemo-lo ambas, demasiado.
Já te disse que tudo contigo tem outro sabor?

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

o dia

Hoje é o dia. O nosso dia. Aquele em que nos fizemos. Aquele em que nos celebramos. Oiço de novo a tua pergunta inquieta, mas convicta. Arriscando tudo, desde logo. Com a certeza de que as horas seriam dias, os dias seriam semanas, as semanas seriam meses e os meses são anos... Mas ainda tendo a benesse de toda uma vida p'la frente p'ra nos partilharmos, juntos.
Lembro-me da primeira vez que te derramei uma lágrima. Sem aviso, com um nó tão grande na garganta. A essa muitas outras se seguiram. Numa noite infinita, cujos pensamentos se amontaram numa única conclusão. Confesso que solucei de dor... mas tive a certeza que te amava.
Sabes... Hoje é o nosso dia. Tal como foi ontem. Tal como foram todos até hoje. Como será amanhã. Faremos de todos os dias nossos. Seremos em todos. Já não dá para ser doutra maneira.
Todos os dias são nossos. Até aquele em que verás uma flor no meio da rua e darás por ti a colhê-la... p'ra ma oferecer e surpreender com o sorriso que só tu tens.
Sei que o meu olhar te confirmará que acertaste em cheio. E que o meu coração te dirá que, enquanto eu respirar, os meus dias só são dias se forem nossos. Hoje é o dia. O nosso dia.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

sono

Já passa da uma da madrugada quando entra em casa. Larga as malas no chão. Apanha o cabelo, põe o tablet a carregar e veste o pijama. São os automatismos accionados pelo cansaço que apenas pede o descanso merecido após um trabalho intenso.
O sono começa a pesar para que os olhos se fechem, mas ainda assim decide desabafar consigo mesma. Entendam-na: desabafar não tem de ser necessariamente sobre coisas negativas. Pode ser apenas o reconhecer das dádivas que a vida coloca no caminho de cada um, p'lo meio das intempéries que acontecem no mundo.
São as pessoas. Os sentimentos, os sentires. São os abraços traduzidos na manifestação física de um acto irrevogável e maior, presente no coração. São esgares da boca, tão únicos e naturais, aqueles, que permanecem na memória. São aquelas coisas que não se vêem e que pairam no ar, entre dois seres que, sabe-se lá porquê, criam uma conexão que não os deixa serem de outra forma.
Ela lembra-se, brilham-lhe os olhos - sabe-lo. Deita-se um pouco mais e encontra o espaço certo na almofada. O corpo está moído, mas a mente está enérgica. As vibrações saltitantes que tem no peito a cada momento perguntam-se se serão reais.
É a hora efectiva de adormecer. Ela vê-lhe o rosto, as mãos. Sente-lhe o aconchego dos braços e imagina-se de novo lá, naquele ninho onde dormir é tão especial que lhe apetece ficar acordada para o sentir ainda mais. Ela vê o que lhe sente.
Dorme, inconscientemente. Com a mão por baixo da cara, mania que ganhou não sabe como. O seu último pensamento é o mesmo, todos os dias: será a plenitude deste amor mais do que o sonho onde entrará nos próximos minutos?